
Bárbara do Amaral concluiu seu comentário do post anterior com as seguintes frases: “Sou a favor da comunicação com responsabilidade, com estudo, madura e sabendo que sua função principal é fazer que a mensagem seja compreendida. Já a inovação é a "forma" e penso que deve ficar em segundo plano.”
Me atenho à frase final e pego carona em Peter Szondi (1929-1971) para dar continuidade às nossas reflexões sobre dramaturgia contemporânea.
Em seu livro “Teoria do drama moderno” Szondi (foto) identifica e comenta o processo de avanço do elemento épico na forma dramática. Para isso aborda aspectos da obra de diversos dramaturgos, traçando um quadro de certa porção do teatro ocidental que vai do norueguês Henrik Ibsen (1828-1906) ao americano Arthur Miller (1915-2005). A forma dramática consistia, grosso modo, na reprodução das interrelações humanas (diálogos), presentificadas pelo artista, preferencialmente na “caixa preta” do palco, diante do público, mas alheias a ele, e ignorantes também de um autor. Essa forma foi sendo invadida aos poucos, mas irreversivelmente, pelos elementos épicos, ou seja, por elementos que remetiam à sua ficção, que se contrapunham à sua ilusão de realidade: flash backs, saltos no tempo, lirismo, paralelismo de discurso, silêncios, placas, filmes, apartes.
Segundo o autor esse avanço do épico, que provocou uma “crise” no drama fechado em si mesmo, ocorria na medida em que os conteúdos emergentes na sociedade do período entravam em contradição com a forma dramática, na qual não encontravam mais correspondência.
O filósofo alemão Theodor W. Adorno (1903-1969) usou um conceito da química para tratar do tema em arte: devemos compreender a forma como conteúdo precipitado. Ao lembrarmos que “precipitado” é um sólido que se forma e se deposita a partir de uma solução líquida, identificamos o caráter sólido da forma e sua origem no conteúdo, a inter-relação de ambos. Então quando Bárbara, refletindo sobre a dramaturgia contemporânea, diz que, na sua opinião, a inovação é a "forma" e que, por isso, deve ficar em segundo plano, talvez possamos alimentar nossa discussão com outras questões.
- O que nos motiva a escrever? Uma ideia? Um assunto? Uma imagem? Uma história? Ou uma forma?
- Decidido ou intuído o assunto, a história, como se dá a escolha da forma? É realmente uma escolha? Ou a ideia já nasce formatada na cabeça? Como o conteúdo escolhido interfere no formato do texto? Ou como o formato molda ou determina o conteúdo?
- Sobre o que queremos falar? Sobre o que é importante falar hoje? Qual a melhor forma de expressar e comunicar esse conteúdo?
- Por que, para que e para quem fazemos teatro?