quarta-feira, 19 de maio de 2010

SOS Beckett



Olá Adelia!
Semana dura...cabeça que pesa, que pende para vários sentidos, o de desistir, de fazer o que realmente quer fazer, abrir nem que seja á faca o caminho, as idéias...
Inicio esse mail dizendo tais palavras não como uma justificativa, mas como uma forma de buscar um direcionamento. Me incumbi de analisar Beckett e descubro um vazio, vazio que veio ao ler "Coisas e Loisas", li(hummm), reli( hã?) li em voz alta( mas.. como assim?) e nada. Acho que da mesma forma que o nada acontece nos textos de Beckett, um nada mais estupido ocorreu em mim. Titubeei várias vezes escrever algo, o lápis e o papel repeliam-se, impedindo que eu anotasse algo. Na pausa dos personagens, eu paralizava, parecia que eu estava esperando que fosse feito algo da parte de A e B. E o nada ainda imperava.
Em uma de minhas leituras, minha mente fugia. E quer saber? Deixei ela fugir. Lembrei da última aula, de Brecht, o "Eu " lírico, a lente do cinema, as colocações indiscutiveis de nossos dois colegas, no pirulito de maça verde, na pasta que não comprei, no meu interesse pelo Teatro do Absurdo, em Monty Python, Surrealismo, Salvador Dali, Beckett, ai Beckett...
Em uma das minhas leituras, cochilei, mas de pronto voltei ao ambiente hostil do meu trabalho, só, vejo que o nada imperava. Se além daquelas palavras tao bem escritas na xerox estavam dois personagens tentando compreender ao outro, ou principalmente, a si proprio, lá estava eu, do outro lado, na "Vidinha real", com cara de vazio, abrindo uma guia no explorer para buscar algo que me impulsionasse a esse universo. E mais uma vez, dentre tantas informações desencontadas, veio meu amigo NADA.
Pra mim foi o fim. Ou o inicio deste e-mail. Penso na impossibilidade de compreender o outro quando não conseguimos nem compreender a nós mesmos. E agora José? Devo jogar palavras ao vento na tentativa delas voltarem respondidas a mim? Ou grito merdas, elefantes, tapetes e limos, e vejo no que dá?Sei lá..
Hoje, terça feira, antivespera de sua aula, sinto-me na impossibilidade de pontuar algo que ninguem pontuará quinta. Hoje estou meio B, somente me deslocando em linha reta, mas diferente dele, não olho ao redor pois não consigo, no entanto sinto que sou um pouco A, ouvindo sons, mas não sabendo quais são; não sentindo mais o fim do dia( ai q horror!!!).
Gostaria de um norte para esta enxurrada de questionamentos. Que no final das contas torna-se apenas um: Meu cronico desnorteamento intelectual.
Até lá, questionarei o absurdo dentro de mim. Semestres melhores virão.


Mariana França
(A imagem foi selecionada pela autora da carta)

6 comentários:

  1. O post de hoje é um e-mail particular enviado pela Mariana. A sua perplexidade diante de Beckett me estimulou a publicá-lo aqui. Integral.

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  2. Que coisa!que susto!O que teria acontecido com a menina sonrriente (sorrizão)?
    A primeira idéia que tive foi algo de preocupação com a matéria ou com algum tipo de mal estar, acidente... ! Já estava me prontificando em pegar o carro e ir a um pronto socorro, hospital, mãe de santo ou algo do tipo. Como nossa mente viaja, como é poderosa e em alguns casos perigosa. Imagética total...
    Mas agora lido ...entendido (comp....reendido??) eu quero colaborar, se isso ajuda não sei, mas quero.
    Para começar, esse (me permitam a expressão desabafo:... ) FDP... do Beckett já morreu tem um tempo e ainda inferniza (*AQUI NO BOM E NO MAU SENTIDO DA COISA), me inferniza e a tantos outros por ai, gera um questionamento monstro e a meu ver completamente salutar, mesmo eu não gostando nem um tantinho dele, e continue optando pela mística ampliada do Artaud, ou a nova para mim GStein, ou o bom e velho (aco ) Nelson Rodrigues, que refletem um algo ordenado num plano que para acessar é complexo por vezes, mas atingidos por eles ...sabemos.
    Beckett nos instaura a dúvida, porque nosso cérebro não sabe dizer se fomos atingidos, não ficamos sabendo se o sabemos... ahhhhhhhhh mas nos deixa algo impagável: a imagem nevoada, escura, surrealista, arquitetada, causando efeito. Samuca causa!
    Mas Beckett é um Sádico visionário? Um místico enrustido ...um sábio disfarçado de bom escritor, olha eu também não sei... só sei que ele ROMPE, e todo aquele que rompe, me chama a atenção mesmo que não me adapte ou não me apeteça, pois a circulação da vida precisa desses desbloqueadores da corrente vital da humanidade tóxica, ou intoxicada...
    Mariana, o mundo esta cheio de gente assim: como o efeito do texto sobre você: vagas ... vazias ... desordenadas ... não sei se poderemos responder as ânsias de sua questão evolutiva ou auxiliar com o “colo” que todos nós precisamos em alguns momentos (alguns ainda por toda uma vida), por outro lado te digo, bem-vinda a vida “adulta”, adulterada? por alguns de nós que te precedem nesse planeta chamado Terra, formado no carbono 14..., ou ainda ...flor!!! calma...toda pergunta trás em si a resposta. E cochilar, se recolher, ficar quietinha... é o caminho também e posso te dizer baseada em experiências reais semanais de minha vida, para esse entendimento de si e que crise existencial (em que patamar for) se resolve com volta a dentro e pedidos de socorro, você aprendeu rápido. (como te admiro!) Eu demorei anos pra pedir socorro... mas sobrevive -se. Você pergunta como compreender o outro se não compreende o que vai dentro de você... outra resposta dentro: o que esta em cima é igual ao que está embaixo, o que está dentro é igual ao que está fora...e por ai vai.

    (segue no outro post...)

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  3. Entenda-se e compreenda-se o resto se resolve. Mesmo porque tudo passa, tudo cura, e sairemos iluminados disso, alguns com chama, outros com luz de holofote ou faroletes. Não importa.
    Nossa Elaine, super bacana você, não?....rs

    Mas como? Me responda...
    Como é que fazemos isso diante de um texto que nos desconstrói, que nos apaga e nos deixa opacos e sem vida para o mundo, quase que nos tornando um personagem do Beckett??

    Não tem receita, pois cada um é um, os suportes internos são diferentes (lembra-se das muletas do Dalí nos quadros?), experiências são diferentes, conteúdos são diferentes, sentimentos são afinados na nossa vibração, mas há caminhos, ouvir além de escutar, ver além de enxergar, saborear ao invés de engolir já começa ajudando... são nossos desafios, uns ganhos outros perdidos. Use Beckett, dialogue com ele, se não resultar: massacre-o, pique bem picadinho, amasse, tempere, coma-o, dilua-lo com leite - nunca com antidepressivos, mastigue com raiva, engula com suavidade, vomite se for o caso, mas ele, esse grande fdmae é sua iniciação aos tempos pós modernos, cada um escolhe a sua. Posso escrever horas sobre isso, mas não vou fazer isso não, tem gente mais competente que eu para quem dou espaço e cito:

    “Não há pintura. Há apenas quadros”

    (...)Não há pintura. Há apenas quadros. Visto que esses não são lingüiças, não são nem bons nem ruins. Tudo que se pode dizer é que eles traduzem, com maiores ou menores perdas, absurdos e misteriosos impulsos em direção a imagem, que são menos ou mais adequados diante das tensões internas. Não se trata de você mesmo decidir o grau de adequação já que você não está na pele do tenso. Ele mesmo não sabe nada a maior parte do tempo. Além disso, é um coeficiente sem interesse. Pois perdas e ganhos se equivalem na economia da arte, em que o calado é a luz do dito, e toda presença, ausência. Tudo que um dia você saberá de um quadro é o quanto você gosta dele (e a rigor por que, se isso LHE interessar). (...)

    Esse texto esta em “Ler o teatro contemporâneo” do Ryngaert pagina 202.
    Só pra constar...vale ler na íntegra.
    É do Samuca. Do Samuel Becket.
    Como diz Malu Pupo, “o que nos resta às vezes de uma peça teatral é a bagagem de areia”, que com o tempo escorre, lenta e contínua em nossa mente de aumento (mente mesmo), Mariana, não há uma resposta pronta, nem um caminho certo, cabe com suas referencias internas, na mescla com o mundo que permite acolher em si, ter esse entendimento e ter entendimento é poder mudar as escolhas de rotas, mapas e trajetórias.
    O melhor desse vazio sonolento, é a possibilidade de preencher com o que você quiser, até pirulito de maçã verde!!
    Mas você irá além, quem não se satisfaz com o medíocre, sempre vai além. Estamos vivendo nesse ciclo de estudos a possibilidade de antecipar passos para sermos bons observadores e em alguns casos aprimora dores do olhar, do mundo e sobre o mundo e traduzir isso em nossos ofícios, sejamos mestres, professores, alunos, artistas...agora não tem volta, o pós moderno se instalou em nossas vidas conscientemente, se convidou e ele entrou, é um vampiro disfarçado!
    Ou fazemos amizade ou vamos matar o cara.
    Acho que as tendências contemporâneas é pro dialogo com a cena do lado. Desfrutemos desse diálogo (diálogo??) e agora? Tem diálogo?
    Boa sorte!
    Abençoadas musas inspiradoras que acolhem as dúvidas dos artistas e que te permitiram sentir assim profundamente.

    E fica aqui o meu agradecimento por tentar ser útil e por aprender mais do Samuca. Acho que passei a apreciar esse ser um pouquinho mais, vou reler o texto e ver se posso ajudar mais na exposição.

    Qualquer coisa o café com bolinho tá de pé!

    Beijares e abraçares,
    Elaine

    OBRA ABERTA
    "toda obra de arte é aberta porque não comporta apenas uma interpretação...." Umberto Eco

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  4. Acho que pensar que você já conseguiu o bastante apesar de ainda não ter percebido ainda...
    Pensar e repensar o vazio já é um ótimo começo pra Beckett

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  6. “Achar uma forma de acomodar todo o caos, essa é a tarefa do artista de hoje.” (S. Beckett)
    É com esta frase que inicio minha pequena contribuição a este emaranhado de idéias que estamos postando aqui. Ainda que timidamente, pois nossa amiga Elaine foi muito sensível ao tratar deste assunto.
    Para mim o texto do Beckett soou muito mais intrigante que os outros, muito mais elucidativo apesar de tantas informações vagas e coisas que passamos a descobrir durante a leitura, pois ele também não facilita em nada a nossa compreensão (muitas coisas inclusive ficaram flutuando na minha cabeça) e tenho para mim que faz isso de propósito. Acho que dessa forma, o nosso exercício de entendimento passa a ser muito mais importante e nos tornamos “co-autores” a partir do momento que saímos do teatro com aquelas frases : “acho que o autor quiz dizer que...” que na verdade são nossas referências brotando do nosso próprio inconsciente.
    Então, não fique amargurada, pois ele conseguiu “acomodar todo o caos” dentro de você...
    E, assim como a Elaine também disse, acho que Beckett mexeu com você e entrou em choque com as suas referências pessoais, sua bagagem intelectual e emocional. Te aconselho a ser mais tolerante, aceite mesmo não compreendendo, deixe ele lá guardadinho até que seu cérebro faça uma série de conexões involuntárias e as suas impressões ficarão mais claras, gostando ou não, entendendo ou não o que ele escreveu.
    E encarar as bizarrices, a subjetividade, a loucura, o absurdo, o fundo do poço, é o que nos traz a tona, é o que nos faz comparar, analisar, enlouquecer.
    E isso é o que eu acho mais legal de tudo, mais válido, mais interessante, porque você vai trazer a tona coisas que desconhecia, pensamentos ocultos e criar novas opiniões a partir daí, que mais para frente mudarão de novo, enquanto vamos nos metamorfoseando pela vida.

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