segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Auto-retrato


Meu aceno anuncia que sou um homem que tem na alma a mesma força motriz dos planetas.
Hoje, depois de velho, sei que estive em busca da busca. Sou um cão de barriga cheia e que mesmo satisfeito vai atrás de um bife quando o fareja. Este cão que só é fiel a ele mesmo dorme tranqüilo com suas pulgas.
Um dia descobri como encontrar Deus: deixei a barba crescer e escalei uma montanha. Perguntei a ele coisas que não soube me responder. Deus tinha uma maçã na boca, mas eu bem que vi seu sorriso por trás da fruta. Com sua mudez me ajudou a compor meus próprios dez mandamentos que gravei na bandeja de prata de um bar. E foi assim que transformaram as minhas leis em canção que hoje toca no rádio dos carros mortos do ferro velho. Quando era menino vi um carro parado sangrando um laranja ácido e desde então neguei este destino.
Sou feliz, pois aprendi a rir com o espelho, enquanto via no retrovisor homens enforcados em gravatas de seda.
Certa vez, sonhei com grãos de bico voando no céu, mas o que almejo mesmo é atropelar o pôr do sol.


(Bárbara do Amaral escreveu este retrato em 1ª pessoa a partir do auto-retrato feito em colagem por Lucas R. Rey)

***********************************

“Sentimos vontade de muitas coisas

Sentimos vontade de ter um carro possante

Lindo, de cor vermelho, brilhante.


Sentimos vontade de voar,

Abrir os braços e deixar nossa mente

nas nuvens nos levar a sonhar.


Sentimos vontade de ir para lugares agitados

E às vezes, queremos apenas um cato sossegado.


Sentimos vontade de sorrir, pular e dançar

Sentimos vontade de nos divertir.

Temos vontade sermos receptivos, simpáticos.

E até mesmo antipáticos.

Sentimos vontade de escrever para despertar o coração.

Temos vontades e sonhos.

Está em nossas mãos tornar nossos sonhos e vontades em nossa realidade.”

(E este é o retrato em 3ª pessoa feito pelo próprio Lucas)

4 comentários:

  1. Que lindo, Bárbara! Não sei fazer um comentário cheio de embasamento teórico sobre este texto. Só vou dizer que me identifiquei, achei lindo e se tornou meu favorito do blog.
    Desculpe, Adelia. Não consegui fazer um comentário mais consistente... me deixei levar pela emoção.

    ResponderExcluir
  2. Bom, agora que pude ler também o texto criado pelo Lucas, acho que posso comentar mais um pouco.
    Adorei o texto da Bárbara, cheio de imagens e como a Adelia disse: visualidades tem poder!
    Mas também achei o texto do Lucas muito forte... as emoções estão afloradas, as coisas materiais e informações superficiais não tem vez no texto dele. Ele nos convida a sentir em cada frase, a experimentar sensações.
    Como faltei na aula passada, eu não fiz este exercício e estou fazendo este comentário depois de ter comentado no texto do Adriano. Então fiquei pensando se a brincadeira deste exercício também não envolve uma abertura para captar com nossa sensibilidade a energia da qual aquelas imagens ficaram impregnadas.
    Bom, isto é uma divagação minha e algo muito subjetivo, eu sei.

    ResponderExcluir
  3. Baby, Carina, Lucas e colegas:
    Vim de nosso ultimo encontro pensando no não significado das imagens, mas sim em seus significantes dentro de nós. Essa força que existe na imagem que toma o nosso Eu pela mão e o faz buscar o eu dentro da imagem a nossa experiência de contato, o que nos unirá no despertar poetente, no tornar visível o invisível, essa conexão forte que explode dentro de nós!

    Que passa pelo orgânico, e nos transforma.

    "Está em nossas mãos tornar nossos sonhos e vontades em nossa realidade."
    E à partir disso nunca mais comerei grãos de bico sem pensar no poder de Deus e sua força, baixando o morro, ou voando alto com suas asinhas grudadas no grão que pode machucar... forte, lindo!
    A poesia que atada na garganta, se desaloja, me tirando do lugar comum!

    Como é rico esse entendimento. Como o prazer nos eleva!
    Isso muda o mundo!

    beijares e abraçares, Elaine PB.

    ResponderExcluir
  4. Obrigada pelo carinho Carina! Você nem imagina como é importante para mim seu comentário, pois te admiro muito.
    Elaine, vc disse algo que eu aprecio muito também, ser tirada do lugar comum. Ter essa vontade que só é saciada pela arte (pelo mesnos eu não vejo outro caminho) é algo realmente fascinante e que preenche algum lugar que não sei identificar.
    Lucas, obrigada por me dar a oportunidade de nos encontrar neste acaso e pela linda imagem que criou. Vamos encontrando vidas nas linhas de um caderno, nas linhas que desenham nossas mãos, nas linhas do trem, do equador, do tempo, do telefone, do bordado do vestido da menina... vamos!

    ResponderExcluir