terça-feira, 14 de setembro de 2010

Viajar


Meu pai criava cavalos na cidade em um enorme terreno que pertencia à companhia de gás

Eu

de manhã nos restos de fogueira dos rapazes da vizinha

Aprendi junto com a minha irmã a

à primeira sensação de liberdade que senti

Passados alguns anos

mudou-se conosco

a cavalo Quando pude comprei uma moto

de surpresa

toda a família

arrumou-se com um casamento coletivo

Hoje moro com minha namorada

temporariamente meu sobrinho

O marido bebia

O garoto tem dado

febre diarréia está mal educado anda mostrando o dedo


dessa vez ele machucou o bracinho

Eu sei que ele está tentando

relóginhos” desenhados no pulso

descobrir bilhetes escondidos

Estou cansado

está me torturando Sinto falta de liberdade Em silêncio

viagens sem destino

não ter a obrigação

Isso não voltar Nem sempre a falta de medo é sinal de coragem

mas há muita mágoa sempre parti

Para ir mais longe

Já estou quase

esse é meu plano

o que mais reluta

de jeito nenhum

tão mal Sou baixinho carnívoro

um bando de cães e destempero

Viajar

voltar menos não voltar tanto assim Ir


(Adriano Geraldo escreveu este retrato em 1ª pessoa a partir do auto-retrato feito em colagem pelo Paulo)


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O garoto, exausto de sua vida cotidiana

Querendo viajar pelo mundo

Conhecer lugares novos

pessoas, refeições, estilos de vida, culturas e tudo mais.

Ele se senta debaixo de uma árvore

Olhando para o céu, ele dá uma piscada

Dando mais uma piscada, ele vai para casa do amigo

Dando mais duas piscadas, ele vai para a Itália

Mais três piscadas, ele vai à China

Mais quatro piscadas, ele vai à Europa

Mais cinco piscadas, ele vai à Austrália

Mais seis piscadas, ele vai à Grécia Antiga

Mais sete piscadas, ele vai para Lua

Dando mais oito piscadas, ele vai para casa de um

Homem batata de chapéu caipira

O garoto estremece a cabeça e se levanta e

diz indo para casa

_ Já fui para vários lugares por hoje. Deixarei

mais um pouco para amanhã.


(E este é o retrato em 3ª pessoa feito pelo próprio Paulo)


2 comentários:

  1. São tantas leituras possíveis que é normal que se tenham idéias diferentes sobre uma mesma imagem. E quando são várias imagens próximas, ligadas ou sobrepostas, com tamanhos diferentes, as combinações de idéias que formarão a colcha de retalhos do texto a ser escrito, torna-se mais ampla ainda.
    Nestes textos do Adriano e do Paulo, notei que a energia que envolveu a um, também pairou no texto do outro... Curioso!
    Qual a probabilidade de trilharmos um caminho parecido num exercício como este?

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  2. essas sincronias, em mim também despertaram curiosidade e uma aceitação! Como da frase do Picasso sobre o Sol...

    Preciosas observações ritmadas como em Sarah Kane; Adriano deu um tom profético, como uma cena em andamento que por absorção me doeu.
    Uma emoção disparada! Piscadelas.

    Elaine PB

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