domingo, 27 de fevereiro de 2011

Texto de Azê Diniz



(Foto: Adélia Nicolete)



- Eu avisei! Não era para esse lado! Eu disse...
- Mas as setas estavam alternadas, quer dizer, trocadas... E agora?
- Sei lá! Melhor colocar o triângulo.
- E agora? O que a gente faz?
- A gente não! Você!
- Vou fugir!
- Não! Tem testemunha. Eu vi e ouvi! Eu ouvi uma mulher gritando...
(Voz em off): Corre, senão você morre! (Som de freada de carro)
- Não consigo mais olhar. Tá todo torto... Todo sujo... Tá tudo quebrado...
- Então não olha pra ele! Olha pro céu!
(E do menino só restou um pipa ao vento...)
- Ó lá! A polícia vem vindo...
- Ai! E agora?


Luiz Sacilotto - Concreção-9213 - acrilica-sobre-tela-110-x-110-cm - 1992


12 comentários:

  1. Mariana Carolina de Lima28 de fevereiro de 2011 às 15:34

    Completa sensação de "bonde andando". De novo a Azê vai construindo o texto com as imagens e metáforas construídas em sala. ADORO... Parece que a escrita é bem organizada, planejada, mas muito sensível... Enxergo essa organização e essa intuição nesse texto. A visibilidade dessa cena, sim já é uma cena, é bela demais. Esse diálogo meio "louco", até engraçado, mas que no fim traz uma rubrica perversa e incrívelmente doce e poética.
    Penso que essa última rubrica " (E do menino só restou um pipa ao vento...)", deve virar texto... vai que um encenador maluco resolve não DIZER isso???

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  2. Azê...

    O legal em seu texto, é que você pega o fragmento exato do conflito. Ele está posto ali na “cara” do leitor e do espectador, ou seja, ao mesmo tempo em que se lê é possível ver o acontecimento! Para mim, é o que mais se aproxima da proposta. Muito bom

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  3. Mariana! Querida e sensível nova amiga!
    Esse é um risco que se corre...
    Bjs da AZÊ!
    A que sempre perde o bonde...

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  4. Nesse texto também reconheço muito o “bonde andando”. Quem são ? De onde vem ? A encenação fica totalmente aberta.
    Só não entendi por que a frase mais poética “(E do menino só restou um pipa ao vento...)” é uma rubrica... o menino e a pipa não são necessários na trama ??

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  5. Que sensação de estar dentro de outro carro e passar por essa cena, e então vou embora querendo saber: meu deus o que aconteceu depois de tudo isso?
    Muito bom Azê...exatamente dentro das indicações do exercício.
    Parece que sinto a tensão da cena, mas ao mesmo tempo há um humor entre as falas. Seu diálogo causa muitas sensações interessantes, principalmente pelas imagens que você proporciona com sua escrita.
    Você não entrega as personagens, mas enxergo duas mulheres perdidas com a situação! São duas mulheres?
    E se você mudasse a frase (E do menino só restou uma pipa ao vento) para o final para não quebrar o ritmo da conversa? Ela foi colocada onde está pela relação com “Olha para o céu!” ? Porque ficou bem poética a forma com que você escreveu, mas eu acho não “combina” com a localização no texto.

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  6. Percebe-se o trabalho que a autora faz no que se refere ao jogo com o leitor em que a exposição do "assunto motor" do diálogo é a parte mais essencial desta dramaturgia.O acontecimento principal não é anunciado de forma precisa no texto. A autora deixa algumas lacunas e pistas, possibilitando o leitor se entregar a algumas suposições e hipóteses, confrontando uma imagem (e ação) intensa a um diálogo inicialmente banal ou pouco importante.
    Vale destacar a pontuação bem trabalhada que deixa claro a situação-desespero dos personagens. Além disso, o texto é de fácil dicção a não ser pelo trecho "Eu vi e ouvi! Eu ouvi..." em que a repetição do fonema -v- faz perder o ritmo do diálogo. Essas frases podeiam ser retiradas do texto (*e se) para se ouvir somente a voz em off que poderia dar a atender ser da mulher citada.
    A frase "E do menino só restou um pipa ao vento..." dá o tom poético ao texto e faz uma contraposição interessante ao "coloquialismo" das falas dos personagens.

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  7. Azê

    Acredito que você conseguiu atingir bem a proposta do bonde andando. Seu diálogo é ágil com frases curtas e ritmo intenso.
    Imagético, nos propõe uma sequência de ações que culminam na morte do garoto.
    Os personagens não são definidos o que nos propõe um gama de diferentes encenações e leituras.
    Adorei o lirismo da frase: “- Então não olha pra ele! Olha pro céu!”, bem como a rubrica “E do menino só restou um pipa ao vento...”.
    Só não entendi uma coisa: por que a personagem fala para colocar o triângulo? Será alguma artimanha para enganar os policiais?

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  8. Monica!
    Sem descartar a malha fina que a Ju me colocou, inserindo a palavra triângulo como imagem...
    - O triângulo, neste caso, é o acessório de segurança usado pelos motoristas no caso de acidente. O objeto significa aos outros motoristas que devem reduzir a marcha e/ou mudar de pista.
    TRIÂNGULO - Sinaliza ACIDENTE LOGO A FRENTE.
    Você não dirige, não é mesmo?
    Beijos e obrigada pela atenção...

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  9. Oferecido a todos:
    Realmente, se algum diretor/encenador resolver tirar a rubrica "MENINO/PIPA", o texto se perderia...
    Alguma sugestão para inserir a imagem sem deixá-la "contada"?

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  10. Gosto da interferência de outro alguém em (off), um curto flashback, a preocupação, agonia, dá uma estranheza quando lê, é muito rápido.
    Passa várias formas de fazer,diálogos dinâmicos, curtos.
    É tão real!

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  11. Oi Azê,

    a imagem da obra, suscita algo assim mesmo, forte e intenso, então aceitando o seu oferecimento, vou tentar colaborar:

    "Não consigo mais olhar. Tá todo torto... Todo sujo... Tá tudo quebrado...
    - Então não olha pra ele! Olha pro céu!
    (E do menino só restou um pipa ao vento...)
    - Ó lá! A polícia vem vindo...
    - Ai! E agora?"
    ................................................

    Algo como inserir na fala um ponto imagético de referência:

    "Não consigo mais olhar. Tá todo torto... Todo sujo... Tá tudo quebrado..., essa linha, enrolou tudo, virou uma linha vermelha... vermelha, vermelha!!
    - Então não olha pra ele! Olha pro céu! isso,
    olha lá o vento levando a pipa, tá longe...
    um pontinho... de luz.


    - Luz nada, olha lá, Ó lá! A polícia vem vindo...
    - Ai! E agora?"

    ................................................

    apenas uma sugestão para colaborar com seu pensamento, mas esse tipo de texto curto é assim, uma flecha que rasga rápido, e marca.
    E eu gosto disso.
    Um grande abraço, Elaine Bombicini

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  12. Querida amiga atriz e autora. Mais uma vez seus colegas fizeram o trabalho direitinho. Os comentários estão todos complementares.
    O que dizer, então?
    Vamos aproveitar para refletir.

    A proposta era a escrita de um diálogo. Para isso lemos e discutimos textos que abordam o diálogo nos moldes contemporâneos.
    Lembro que na aula você disse estar com receio do seu ter saído dramático demais.
    Então aproveito para comentar agora.
    Talvez a gente ainda confunda o contemporâneo com o confuso ou obscuro.
    Um texto claro não faz dele um drama, assim como um texto complexo não ganha o rótulo de contemporâneo, necessariamente.

    Portanto, seu texto traz, sim, um drama. E também há diálogos claros, que caminham numa progressão, que apresentam um conflito.
    De elementos contemporâneos ele traz uma indeterminação dos personagens (em relação a número, gênero, nome), do espaço, por exemplo. O recurso da voz off. A situação vai se revelando aos poucos, havendo, inclusive, a rubrica que, de acordo com a passagem para a cena, pode ser emitida também.
    Enfim, traz uma crise forte, um momento decisivo, que comunica, que causa tensão, etc. Portanto, creio que você não deva se preocupar, pelo menos agora, em que categoria ele se encaixa.

    Abraços.

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