sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

O porteiro - Texto de Mariana C. de Lima



Iberê Camargo - Ascenção - 1973
óleo sobre tela - 57 x 40cm



Sentado no banco da praça, Zé lê o jornal. Ao seu lado um alguém... qualquer um. Zé resmunga, fala como que sozinho; que diaxo... deixa os menino em paz! Que mal faz escrever nos muro?
A pergunta é prá si mesmo. Silencia relembrando.

“Sabe que já fui porteiro? Em prédio grande... chique... ali no centro tinha um edifício... “Aconchego”. Lembro do meu primeiro dia, o prédio era novo mas tinha cheiro de musgo por causa de uns vasos velhos que ficavam na entrada. Trabalhei quinze anos lá, no começo, tudo era limpo, bem cuidado, mas depois... ninguém mais queria saber de participar das reuniões do prédio... os morador foram abandonando... uma tristeza de dá dó... E depois tinha essa garotada... que escrevia nos muro... cada um achava que podia fazer o que quisesse. Não adiantava falar... eles me xingavam, diziam prá cuidar da minha vida... E não era isso que eu tava fazendo? Cuidando do prédio, das coisas... É, eu devia ter saído e cuidado da minha vida mesmo... sabe, eu era novo trabalhador e não queria que os meninos me faltasse com respeito. Eu cuidava de tudo... até limpava! Esses meninos teimavam em me desrespeitar. O prédio caindo aos pedaços e ainda assim eles continuavam estragando, pixando... eu chamava os pais, as mães... ninguém ligava! Mas teve aquele maldito dia que o filho da D. Marisa resolveu pintar bem na porta do prédio... e o pior, tudo combinado, os outros me distraindo, quando eu voltei, um palavrão tão grande, assim, bem na porta. E eles todos rindo, sentados na escada. Rindo de mim... eu liguei prá dona Marisa, só podia ser o Ricardo, filho dela, sabe? E ela era a única que ainda descia, né? Não demorou nem um minuto e chamaram o elevador lá no sétimo, o andar da Dona Marisa. O filho dela, Ricardo, me xingou ainda mais, de mentiroso, que eu não tinha como provar...

Não demorou nada e então um barulho terrível, me deixou surdo... o elevador despencou de lá de cima. A dona Marisa morreu na hora. E eu levei uma surra dos meninos, mas eu bem que mereci, prá que fui incomodar a Dona Marisa por causa de uma bobagem dessas... pintar numa porta...





(Esta é a primeira versão do "relato de experiência" escrito pela Mariana a partir da apreciação da tela de Iberê, publicada na postagem anterior.
Depois das análises dos colegas, o texto será reescrito e publicado aqui, em sua segunda versão)


Segunda versão





Sabe que já fui porteiro? Em prédio grande... chique... ali no centro tinha um edifício... “Aconchego”. Lembro do meu primeiro dia, o prédio era novo mas tinha cheiro de musgo por causa de uns vasos velhos que ficavam na entrada. Foi meu primeiro emprego...Trabalhei quinze anos lá. No começo, tudo era limpo, bem cuidado, mas depois... ninguém mais queria saber de participar das reunião do prédio... os morador foram abandonando... uma tristeza de dá dó... E depois tinha essa garotada... que escrevia nos muro... cada um achava que podia fazer o que quisesse. Não adiantava falar... eles me xingava, dizia pra eu cuidar da minha vida... E não era isso que eu tava fazendo? Cuidando do prédio, das coisas... É, eu devia ter saído e cuidado da minha vida mesmo... Sabe, eu era novo, molecote, num tinha ninguém que impedisse um rapaz forte feito eu de trabalhar... e eu num queria que os meninos me faltasse com respeito. Eu cuidava de tudo... até limpava! Esses menino teimava em me desrespeitar. O prédio caindo aos pedaços e ainda assim eles continuava estragando, rabiscando... Eu chamava os pai, as mãe... Ninguém ligava! Mas teve aquele maldito dia que o filho da D. Marisa resolveu pintar bem na porta do prédio... E o pior, tudo combinado. Os outros me distraindo e quando eu voltei, um palavrão tão grande, assim, bem na porta. E eles tudo rindo, sentado na escada. Rindo de mim... Eu liguei pra dona Marisa, só podia ser o Ricardo, filho dela, sabe? E ela era a única que ainda descia, né? Não demorou nem um minuto e chamaram o elevador lá do sétimo, o andar da Dona Marisa. O filho dela, Ricardo, me xingou ainda mais... de mentiroso, que eu não tinha como provar, mas não demorou nada e então um barulho terrível, me deixou surdo... O elevador despencou... de lá de cima...do sétimo, o andar da dona Marisa. A pobre morreu na hora. E naquele dia eu fui espancado por aqueles menino, mas eu bem que mereci, pra que fui incomoda a pobre da dona Marisa por causa de uma bobagem dessa... pintar numa porta...

3 comentários:

  1. Os dois textos bem teatrais, gosto muito, a forma dinâmica da escrita já nos dá , sem querer a intenção da fala.
    Creio que ter tirado a 'rubrica' da segunda não fez muita diferença, e ter acrescentado que ele era "molecote,...", isso já é claro na 1ª versão quando diz 'eu era novo, trabalhador...'

    Os dois são bons e dá vontade de fazer.

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  2. prefiro seu texto sem rubrica pelo simples fato de imaginarmos o que quisermos com esse personagem. Gosto do seu texto pela sonoridade. Os comentários do personagem mostra uma sabedoria popular muito atraente. Montaria fácil esse texto

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  3. Oi Mariana,
    que gostura de leitura. Ambos os textos me agradam. Gosto desses personagens generosos, que tem muito a oferecer, dentro de uma certa simplicidade. Uma realidade possível. Gosto do ritmo e da sonoridade, algo que favorece uma possível montagem. Sinto uma vontadezinha mórbida de explorar o lado mais sombrio desse personagem, algo como uma virada poderosa, mas confesso que não saberia como. De qualquer forma ótimos textos. Abraços, Elaine

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