domingo, 27 de fevereiro de 2011

Pomba - Texto de J. A. de Lima


José Antonio de Lima (o autor do texto) integrado à obra de Sacilotto
(Foto: Adélia Nicolete)


(...)
- Ela não perde a pose!
- É, ela não perde a pose!
- Dá dó! Não chama atenção... Banal!
- Às vezes, até voa... Aponta para o espaço, indica a direção, aceita o espaço... E vai!
- Coitada, de tão suja já nem sabe mais a cor!
- Mas há cor, ainda!
- PRETA!
- Talvez... Se... Lavassem...
- Impossível! Não se lava isso, é contra a natureza dela! Se a lavarem, aí é que ela não voa nunca mais! (Ri).
- (Com um leve sorriso) Ah! Voa... Sempre voa! Quem a compreende sabe que voa!
- (Leve sorriso) Mas pra quê, compreendê-la? Não há necessidade disso...
- Ah! É Claro que há! Ela é parte da cidade! É como... Um abrigo que já foi violado... Ela pertence a todos e mesmo assim ninguém a tem!  Alimentam-se dela todos os dias e nem a sabem!
- (Rindo) Imagina, Você está doido, amigo! É  ela que se alimenta da cidade... Ela... É linda! É Pura arte!
- Pra mim, é Pomba!
(...)



A pomba na obra
(Foto: Adélia Nicolete)

10 comentários:

  1. Mariana Carolina de Lima1 de março de 2011 às 17:29

    Lima, são dois conversando??? Imagino que não. Para mim são todos aqueles "sentados" no concreto, aqueles que usam a obra como banco... que não enxergam a arte bem diante da cara, ou da bunda. Mas tem UM,e esse um fala da obra, fala de arte. Ele é a poesia, embora os outros sejam a graça. E se forem apenas dois, sugiro uma pequena mudança na penúltima fala:
    - (Rindo) Imagina, Você está doido, amigo! É ela que se alimenta da cidade...
    - Ela... É linda! É Pura arte!
    No texto, não existe essa divisão dos emissores, então tive a impressão que o personagem que falava da obra é o que acaba falando da pomba. Não sei se foi de propósito, mas eu gostaria mais se fosse assim... Sei lá se me entendeu... No mais, ADOREI seu texto. Bem poético, cheio de imagens metafóricas e o melhor de tudo, muito engraçado, bem sua cara...

    ResponderExcluir
  2. Adorei como tudo foi revelado aos pouquinhos, pequenas doses sobre o que os personagens falavam, somente imagens e suposições. Achei ótimo !!!!
    Sem definição das personagens a encenação fica totalmente aberta nos deixando somente a certeza do assunto: “é Pomba!” Rs.

    ResponderExcluir
  3. Lima achei fantástico seu texto. Remete-me a uma tirinha de jornal, pois está muito crítico socialmente e culturalmente, mas ainda contém muito humor, isso é que é arte!
    Tenho mil imagens enquanto leio e ainda assim não consigo definir as personagens, o que dá grande margem a enormes possibilidades de montagem.
    No início não se sabe exatamente do que se fala, e aos poucos você vai entregando que nem mesmo que está na conversa fala sobre a mesma coisa. Muito bom! Primeiro eu achei que fosse uma bandeira o assunto, depois fui percebendo que um está falando da obra, enquanto o outro fala da pomba...Mas acredito que só saquei que falavam sobre a escultura porque participei do mesmo do processo de criação, um outro leitor criaria em sua cabeça o tema da conversa: estrutura aberta!
    Você está totalmente dentro da proposta do exercício e ganhou uma fã.
    Não consigo imaginar este diálogo melhor do que está.

    ResponderExcluir
  4. O jogo de palavras simples desta escrita é tão bem trabalhado que da o tom poético do texto. São inúmeras partes bem escritas, valendo a pena destacar: “aceita o espaço... E vai!”; “Alimentam-se dela todos os dias e nem a sabem!” .
    A brincadeira que o jogo do diálogo propõe deixa o texto leve e cômico sem perder o seu tom de crítica. O autor trabalha um material do cotidiano que aparentemente é indiferente de uma forma a ordená-lo e combiná-lo com uma dramaturgia rica. Já no título se revela a peça mestra do jogo com o leitor em que a exposição do assunto do diálogo está no cerne desta dramaturgia. Apesar disso, o assunto principal é somente anunciado de forma precisa e direta na última fala (que pelo uso das reticências no início e no final dá a idéia de ser um trecho retirado de um texto). A maneira como o autor desencadeia as idéias observadas nas rubricas (“Ri”. “Leve sorriso”.) enuncia a intenção de comicidade e ironia, sendo que desde o início do texto faz-se claro a intenção de não deixar o assunto subentendido.
    Para completar proponho um “e se”: retalhar as réplicas, construir um diálogo fragmentado fugindo totalmente dos critérios convencionais de perguntas e respostas, mantendo o tom poético, mas excluindo os personagens falantes, enaltecendo o assunto, deixando mais ainda o que é óbvio.

    ResponderExcluir
  5. Que loucura! Somente quem sabe do processo sabe o quão magnífico esse autor foi ao retratar a obra, o local, as pessoas, “o ser ou não ser do que sei lá o que era aquilo...”. Tudo que foi dito em sala, todas as imagens, sugestões, referências foram transformadas nas imagens mais corretas e certeiras, que eu, claramente, nunca teria alcançado.
    Não era da arte, da obra, que ele falava... Era da pomba... Credo! Como pôde ele me transportar de uma certeza para outra de maneira tão acalantada... Socorro! Me tirem do lado desse homem! Ou me amarrem á ele para que eu possa flutuar sobre as minhas palavras... Criar dessa forma, em vinte minutos, é o que eu realmente acredito ser espontâneo e genial. Danço de alegria, faço homenagens e treino com esse guerreiro. Mais uma vez, agradeço... Por você,e para você,Lima!

    ResponderExcluir
  6. Lima

    Seu texto tem uma sonoridade muito interessante (principalmente algumas aliterações e assonâncias). Através dele é possível um jogo de palavras (sobretudo inversões) que monta uma espécie de quebra-cabeças, cujo resultado final é esta pomba/alegoria.
    Não há uma definição fechada dos personagens que observam esta ave, o que possibilita diferentes leituras desta mesma cena.
    Muito poética a frase: “Aponta para o espaço, indica a direção, aceita o espaço... E vai.” Através dela é possível imaginar toda a sequência de ações desta pomba. Acho lindo: “aceitar o espaço”.
    Só tenho um e se... para você:
    E se você retirasse a última fala: pra mim ficou tão claro que se tratava de uma pomba que o final tornou-se um pouco revelador demais.
    Você avalia se esta alteração é necessária.

    ResponderExcluir
  7. Esse fato de que cada um está vendo uma coisa e acham que estão falando da mesma coisa é ótimo!
    É divertido, dá diversas leituras, propostas de encenação, que poderia ser na rua mesmo.
    Seria muito bom.

    Pra mim é pomba!..rsrsrs

    ResponderExcluir
  8. Que aventura!
    Este texto está muito bem elaborado, esse jogo de palavras que estende na poética uma curiosidade e imaginação muito melhor, trás muita vida ao mesmo.
    Ele vai dando pistas e trabalhando passo a passo até a descoberta do resultado final.
    Esse final é Pomba,é surpreendente, além do que o processo é muito divertido.
    Simplismente muito bom!

    ResponderExcluir
  9. Lima,

    como seus colegas falaram tanto e tão bem, fico me sentindo desnecessária, como Sarrazac anunciou naquele texto que lemos.
    Mas como eu preciso justificar minha presença nesse ateliê, não vou falar do seu texto, e sim do seu olhar.
    A proposta foi que saíssemos em trajeto pelo centro rumo ao Sacilotto e de volta à faculdade. Teríamos que observar sensivelmente o máximo possível, anotar, imaginar, etc.

    Desde seu primeiro texto, o que você mais tem ouvido do grupo é: o Lima é um poeta. E você mesmo se sabe e se define poeta, entre outras coisas.
    Pois bem, aqui vai meu comentário: a poesia está primeiro no seu olhar, depois na escrita. Isso fica claro nesse texto especificamente.
    Todos fizeram o trajeto, todos viram a escultura e o descaso, quase todos viram a pomba.
    Se todos olhassem da mesma forma, teríamos textos bem parecidos.

    E assim é com o nosso cotidiano. Quantos de nós são capazes de olhar o mundo poeticamente (isso é diferente de ser ingenuo, tolo, etc). Olhar o mundo e ver nele uma fonte de criação inesgotável. Ver na harmonia e na desarmonia motivos para a escrita. Motivos para transformar o sentimento em escrita. Esse sentimento pode ser amoroso? Pode. E pode ser de revolta, de indignação, de medo, de assombro, de maravilhamento.
    O importante é desenvolver essa capacidade de olhar o mundo com olhos poéticos (criativos), capazes de ultrapassar o véu da realidade, a superficialidade do aparente e traduzir isso em palavras.

    Junto dessa observação (poética) vai o meu abraço.

    ResponderExcluir
  10. Olá Azê, tudo bem?

    Faço parte de um projeto do Museu Brasileiro de Escultura, o MuBE Virtual.
    Para conhecimento, o MuBE Virtual é uma ferramenta cujo objetivo é montar um banco de dados das esculturas do país. Por meio de um site colaborativo, qualquer pessoa pode cadastrar imagens e informações da arte tridimensional em espaços públicos. Da mesma maneira, qualquer pessoa pode ter acesso a esse material e conhecer mais sobre a produção artística instalada nas ruas, praças e parques brasileiros. Hoje, o site conta com um acervo com cerca de 500 esculturas, mas ainda falta muito.

    Estamos tentando cadastrar a obra Concreção 005 de Sacilotto, mas não possuímos nenhuma imagem dela. Gostaria de saber se posso utilizar livremente as fotos de Concreção que estão postadas aqui, com os devidos créditos a sua autoria.

    Aproveito a oportunidade para convidar a você a a todos que visitam o blog, visivelmente preocupados com a preservação do patrimônio artístico, para conhecer a iniciativa: www.mubevirtual.com.br

    Obrigada! Aguardo retorno.

    Luna Rosa Lopes
    Equipe MuBE Virtual
    info@mubevirtual.com.br
    (11) 3326 2700 - ramal 104

    ResponderExcluir